Se existe um gênero popular no cinema que vive sendo atualizado e explorado por muitos cineastas desde a década de 1915, é o dos filmes de Vampiros. As obras podem ser de terror, ação, romance e até mesmo comédia, devido a gama de oportunidades estilísticas e narrativas possíveis em uma história sobre criaturas mitológicas que se alimentam de sangue. Cada filme é o retrato de sua época, do ponto de vista social e ideológico, além de apresentarem escolhas visuais e sonoras ousadas e expressivas.
A obra definitiva que serviu de base para a moderna ficção sobre o tema é o livro Drácula, publicado em 1897 e escrito por Bram Stoker. A partir daí, todas as produções beberam dessa mesma fonte. A essência do vampiro que conhecemos hoje (exceto os que brilham no sol) está enraizada nas páginas de Stoker – uma das maiores obras literárias do mundo.
Obviamente que, assim como todos os gêneros, os filmes de vampiros já passaram por fases ruis e esquecíveis. Mas o assunto aqui é falar das boas obras proporcionadas pelo tema. Em ordem de lançamento, listei vinte filmes “vampirescos essenciais” (e talvez pouco conhecidos) para assistir:
1932: O Vampiro (Vampyr) – Alemanha
Conto sobre um pesquisador que encontra, pela primeira vez, a evidência da existência de um vampiro. Talvez o filme que menos desperte interesse (para alguns), já que o longa alemão é rodado inteiramente em preto e branco, e mudo. O que não é negativo, que fique claro! Com uma atmosfera claustrofóbica e sombria, o suspense patina entre a fantasia e o mistério de forma sutil. O uso das sombras é um dos pontos fortes – recurso utilizado até hoje em diversas produções. Cheio de personalidade, Vampyr é uma obra rica e expressionista.
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1963: O Beijo do Vampiro (The Kiss of the Vampire) – Reino Unido
Se esse título te faz lembrar a telenovela brasileira de Antônio Calmon, lançada em 2002, você tem sorte, pois foi, de fato, uma pérola da televisão brasileira. Mas o filme em questão é a divertida e pitoresca obra de Don Sharp. Quando um casal é vitima de um culto sinistro numa pequena vila, vão precisar de toda ajuda que puderem. Suntuoso de ponta a ponta, repleto de ótimos figurinos e cenas inesperadamente tensas, The Kiss of The Vampire é uma viagem utópica à romântica década de 1960.
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1967: A Dança dos Vampiros (The Fearless Vampire Killers) – EUA/Reino Unido
Em uma tragicômica viagem invernal pela Transilvânia, um professor aventureiro e seu discípulo medroso buscam evidências da existência de vampiros. Dirigido e escrito por Roman Polanski (mais uma vez refletindo o brilhantismo da direção nas atuações) o filme é impecável no humor e na ambientação lúdica. A beleza do roteiro é que, enquanto os protagonistas encaram a aventura com seriedade, ele não o faz – o que torna tudo mais despretensioso e divertido. The Fearless Vampire Killers é uma fantasia deleitosa e irretocável.
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1971: Filhas das Trevas (Daughters of Darkness) – Bélgica
Perversidade, erotismo e onirismo; os ingredientes misturados em doses certas para apresentar uma das melhores versões cinematográficas da lendária Condessa Elizabeth Bathory (conhecida popularmente como condessa sangrenta). O uso das cores e contrastes cria uma atmosfera horripilante e vistosa. Vale destacar o ótimo desempenho do trio de protagonistas com suas atuações imersivas e cativantes. Tudo isso junto a um roteiro hermético e eficaz temos: Daughters of Darkness – uma obra estarrecedora e poética.
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1974: As Filhas de Drácula (Vampyres) – Reino Unido
Impetuoso do começo ao fim, Vampyres é um terror angustiante e sem pudor, que nos leva ao lado mais primitivo e sensual dos vampiros. Acompanhamos a lenda de duas vampiras que atraem vítimas para seu banquete noturno. A luxúria e a violência funcionam conjuntamente, tornando as personagens mais assustadoras e reais. Apesar do segundo ato arrastado, o filme compensa pela tom dantesco e bela fotografia de Harry Waxman.
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1975: Lábios de Sangue (Lèvres de Sang) – França
Um perfeito exemplar europeu. Infalível em sua estética macabra, Lèvres de Sang é uma obra essencial do cinema francês. Um homem que busca algo esquecido e misterioso em seu passado, levando-o a uma experiência mística. O ritmo lento é o maior vilão do filme, porém justificável por conta da abordagem teatral e lírica. A intensão aqui não é criar personagens memoráveis ou belos efeitos visuais, mas sim despertar sentimentos, emoções e desejos. Um filme deleitosamente horripilante e caloroso.
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1976: Martin – EUA
Misterioso e funesto, Martin é mais uma grande obra de George A. Romero – famoso por seus icônicos filmes de zumbi. Tudo é narrado do ponto de vista do protagonista, um vampiro que busca sobrevivência em um caminho trilhado por mortes e medos. Muito mais de que um horror trash e provocante, Martin é uma crítica social sobre violência, religião e puberdade. Sem dúvida o filme que mais aproxima um vampiro do mundo real – sem fantasia ou escapismos. Apesar do ritmo vagaroso, o longa é impactante visualmente e preciso no quesito suspense.
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1983: Fome de Viver (The Hunger) – Reino Unido
O primeiro filme do consagrado diretor Tony Scott é um dos melhores do gênero a expressar as sensações e delírios que um vampiro pode proporcionar a um humano. Desde a sedução até a submissão da sede por sangue, tudo é amarrado a uma experiência visual e sonora hipnotizante. O longa tem como destaque David Bowie e Susan Sarandon, fazendo às vezes das vítimas da cativante predadora, interpretada pela atriz Catherine Deneuve. Passando pelo horror e o trash, The Hunger é uma viagem macabra e erótica pelo mundo das trevas nos anos 1970.
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1985: A Hora do Espanto (Fright Night) – EUA
O que você faria se descobrisse que seu vizinho é um vampiro que matou uma garota? Ou pior, o que você faria se tivesse presenciado o assassinato? É a partir dessa premissa que Fright Night introduz uma aventura sobre um demônio versus um garoto comum. O longa acerta ao colocar como protagonistas adolescentes em suas fases de descobrimento e questionamentos, enfrentando os medos e angústias em forma de vampiro. Um suspense cômico com um toque de fantasia e horror. A combinação da trilha sonora, maquiagem e fotografia resultam em uma das melhores aventuras vampirescas. Vale a pena conferir a continuação e os remakes.
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1987 Os Garotos Perdidos (The Lost Boys) – EUA
Desde o visual até a trilha sonora, Os Garotos Perdidos é um filme de vampiro tipicamente oitentista. Ambientado no verão da Califórnia, diversos crimes e desaparecimentos tomam conta da pequena de Santa Carla. Unindo coragem e determinação, dois irmãos enfrentam o mistério que envolve uma gangue de motoqueiros. A obra vampiresca de Joel Schumaker diverte e impressiona visualmente, emprestando elementos de filmes clássicos dos anos 1980. The Lost Boys é uma aventura despojada, porém heroica e envolvente.
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1992: Drácula, de Bram Stoker (Bram Stoker’s Dracula) – EUA
É claro que não poderia deixar de falar da melhor adaptação da história que deu origem as grandes obras sobre o tema. Se já não bastasse o roteiro envolvente, a trilha sonora épica e o elenco admirável (Anthony Hopkins e Gary Oldman estão impecáveis), o longa ainda tem a direção de ninguém menos do que Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão e Apocalipse Now). Perfeito em todos os aspectos técnicos, o filme é cheio de sequências impressionantes e inesquecíveis. Um dos melhores, se não o melhor do gênero.
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1993: Cronos – México
O diretor e roteirista Guillermo Del Toro tem o costume de nos apresentar excelentes obras a cada gênero que passa. O que não foi diferente em seu primeiro longa metragem – um suspense instigante e aterrorizante do início ao fim. Após um vendedor de antiguidades encontrar um objeto místico, sua vida passa a trilhar um caminho de mistérios e revelações surpreendentes. Um filme que vai se tornando cada vez mais macabro e imersivo. Devo dizer que é um thriller para quem tem estomago forte, porém é mais justificável fechar os olhos em alguns momentos do que deixar se apreciar um dos melhores filmes de Vampiro!
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1994: Entrevista Com o Vampiro (Interview with the Vampire: The Vampire Chronicles) – EUA
Baseado no excelente livro das crônicas vampirescas de Anne Rice, Interview with the Vampire tem um roteiro esmerado e esperto. O filme conta a história do vampiro Louis, e sua jornada diabólica e traumatizada pelo passar das décadas. A direção de arte, a fotografia e a trilha sonora são irretocáveis. O elenco é a espinha dorsal dessa romântica e nefasta história de vampiros. Brad Pitt, Tom Cruise e Antônio Bandeiras estão no auge com seus personagens densos e assustadores.
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1995: Um Vampiro no Brooklyn (Vampire inBrooklyn) – EUA
Se já não bastasse a habilidade absurda de Eddie Murphy em criar personagens, o filme tem direção de Wes Craven, um gênio do cinema de terror. O talento do ator é indiscutível! Desde um vampiro implacável até um pastor possuído, Murphy demonstra total controle de seu tom e humor. A comédia intercala com maestria os momentos cômicos com o horror – não pense que um filme Wes Craven dispensaria elementos assustadores, mesmo que seja uma comédia. Criativo e muito divertido, Vampire in Brooklyn mostra como não é fácil ser um vampiro na América.
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1998: Blade – O Caçador de Vampiros (Blade) – EUA
Um semi-vampiro caçador de vampiros; quase como um semideus que luta contra a ira dos deuses, seus criadores. Muito sangue, lutas fantásticas, criaturas monstruosas e sequências de ação dirigidas com maestria. Um herói implacável adaptado dos quadrinhos da melhor forma possível! Sem dúvida é um dos melhores do gênero no quesito ação. O ator Wesley Snipes está imbatível e demostra vigor físico no papel que marcou o seu auge em Hollywood. Se gostar do longa, faça um favor a si mesmo e assista a continuação!
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2008: Deixe Ela Entrar (Låt Den Rätte Komma In) – Suécia
Poético, encantador e ao mesmo tempo assustador e chocante. Deixe Ela Entrar é uma história romântica e cheia de simbolismos sobre um garoto enfrentando as dificuldades da adolescência num subúrbio de Estocolmo – uma cidade tomada por uma onda de assassinatos incomuns e medonhos. Sem cair em clichês ou situações previsíveis, o longa trata o vampirismo como maldição e heroísmo, mostrando criatividade e sutileza em cada decisão narrativa. Belíssimo de quadro a quadro, o filme sueco usa de metáforas visuais e diálogos agridoces para contar uma das melhores fábulas adolescentes do cinema de terror.
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2010: Sede de Sangue (Bakjwi) – Coreia do Sul
O vampirismo como criação do homem. O visionário diretor Park Chan-Wook esbanja talento e simbolismo em sua obra fetichista sobre vampiros. Um padre se voluntaria para um experimento médico e como resultado, acaba se transformando em um homem movido por prazeres e sede de sangue. Aproveitando-se de um gênero propício para retratar sexo e violência de forma estilizada e grotesca, Bakjwi explora misoginia e taras alternando entre o romance e o terror. O mais interessante é que não há misticismo ou fantasia – é um filme de vampiro essencialmente carnal. Um ótimo banquete de horror e avidez.
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2012: Byzantium – Reino Unido
Byzantium é um filme maior do que aparenta ser. Por trás de uma trama aparentemente simples, há a criação de uma fábula e um universo vampiresco particular e cativante. Duas vampiras (mãe e filha) vivem se mudando de cidade em cidade, levando uma vida escassa em busca de abrigo e sobrevivência, até suas motivações e desejos começarem a divergir. A fotografia é majestosa e memorável, assim como o desempenho das duas protagonistas. Desde as presas até a vulnerabilidade, o vampirismo de Byzantim foge dos padrões clássicos e mostra o peso da eternidade de forma melancólica e crua.
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2014: O Que Fazemos Nas Sombras (What We Do In The Shadows) – Nova Zelândia
Barroco e moderno ao mesmo tempo, a comédia de Taika Waititi é uma obra prima do gênero. Com um humor inteligente e raro atualmente, o filme brinca com o há de melhor e de pior sobre vampiros, funcionando como um documentário fictício – acompanhando a vida de quatro vampiros milenares que vivem juntos na Nova Zelândia. Uma direção arrojada, atores hilários e um roteiro divertidíssimo. Pouco comentado no Brasil (uma pena), What We Do In The Shadows é uma aula de cinema e comédia de qualidade.
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2014: Amantes Eternos (Only Lovers Left Alive) – Reino Unido
O talento de Tom Hiddleston é somado atuação verossímil de Tilda Swinton em um soturno e garboso drama vampiresco. Fascinante do começo ao fim, Only Lovers Left Alive aborda o gênero de uma forma melancólica e irônica, narrando a vida de dois amantes condenados a eternidade juntos. Aqui, o diretor Jim Jarmusch conta como seria de fato, viver para sempre, experimentando culturas, línguas e conhecimento pelo mundo ao longo os séculos. Mesmo com uma abordagem mais romancista e erudita, a fotografia escura e a trilha sonora funesta conduzem sinistramente cada fotograma. Amantes Eternos é um perfeito exemplar moderno de um gênero cinematográfico (aparentemente) imortal.
Por: Luís Vinícius Melione